O começo e a resistência do Psicodelia

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Se você tem dez anos de festas em seu currículo sabe o quanto era difícil encontrar informações e materiais de qualidade naquela época. Poucos portais tentavam manter uma comunidade, ainda em crescimento, informada sobre artistas, festa e tudo mais que envolve o, agora, popular termo CENA.

Portais como o EletroGralha, Disturb, Psyte sucumbiram ao Orkut e posteriormente ao Facebook. Hoje as informações surgem em sua timeline a cada segundo, a cada dia dezenas de convites de festas aparecem nas suas notificações e se não puder comparecer em uma destas dezenas de festas não se preocupe basta você ficar conectado no whatsapp para receber vídeos e fotos.

Mas, um destes portais criados no início do boom da música eletrônica por aqui, faz jus ao nome e resiste. O Psicodelia, criado em 2007 para reunir informações entre amigos cresceu e hoje, se tornou uma das maiores referências nacionais (se não a maior) quando o assunto é música eletrônica. Para comemorar estes incríveis 10 anos de existência, persistência e resistência conversei um pouco com Eliel Cezar, idealizador do portal e um dos responsáveis por manter público e artistas sempre informados sobre esta nossa cultura.


São 10 anos informando o público, como surgiu a ideia do portal?
O Psicodelia surgiu como um blog em 2007. Eu frequentava festas há pouco mais de um ano e queria entender melhor tudo o que eu via acontecendo nas raves, mas o conteúdo era escasso e muito diluído. Depois de alguma pesquisa, descobri um site de notícias relativamente grande e atualizado com frequência, o “Psyte”. Além dele, a principal fonte de informação eram os tópicos e comentários dos usuários do EletroGralha, o principal fórum da época.

Conforme eu descobria conteúdo novo eu enviava os links por email para alguns amigos dizendo “ei, olha isso que foda”, até que caiu a ficha de que seria mais prático reunir esses conteúdos na forma de um blog. Aí foi só pensar num nome e publicar o blog.

Tudo começou há mais ou menos um ano e meio atrás. Levados por um casal de amigos, eu e minha namorada fomos à nossa primeira rave, numa noite fria de maio, em Curitiba. Eles viviam dizendo que nós tínhamos que ir, “de qualquer jeito”, mas eu ainda não entendia o por quê.

A música intensa chamou a atenção logo de cara. Com o passar das horas em frente ao palco, apertado entre centenas de pessoas, eu contabilizei 2 empurrões seguidos de 5 pedidos espontâneos de desculpa. Esse clima de “paz e amor” para mim era inédito e ao mesmo tempo surpreendente. E eu vi que isso era bom. (primeiro post do Psicodelia)

Quais as principais dificuldades no inicio do Psicodelia?
Encontrar conteúdo e ter acesso às pessoas. Hoje todo mundo usa Facebook ou outra rede social e você consegue, com pouco esforço, ter acesso à DJs, produtores, gravadoras, festas, etc. Há 10 anos tudo parecia muito mais distante, mais escondido. E também enfrentamos alguma resistência das grandes festas e artistas pelo fato de sermos “apenas um blog”, pouca gente queria falar conosco. Depois disso adotamos um formato visual semelhante a um portal de notícias e tudo melhorou, embora o conteúdo continuasse exatamente o mesmo.

Hoje o portal se tornou referência em conteúdo, quando vocês olham para trás esperavam uma posição como esta?
Sim, havia um sonho, uma ambição nesse sentido. Mas longe de ser um grande objetivo na vida. Era mais como aquela coisa que você acha muito muito legal e gostaria de ter (e trabalha pra isso), mas se por acaso não der certo, tudo bem. Mas como sonhar é de graça e havia algum tempo livre depois do expediente, fomos fazendo.

Existe alguma matéria que mais sentem orgulho?
Talvez não uma específica, mas um formato que eu sei que ajudamos a popularizar: o review de festas. A ideia era voltar festa e escrever uma matéria extensa com tudo o que teve de bom e ruim no evento: estrutura, lineup, público, enfim, a experiência como um todo, assim que não foi no evento ficava sabendo tudo o que rolou. Como os relatos são sempre 100% sinceros, já renderam muitos elogios do público e também muito ódio de DJs e produtores de eventos que não concordaram com a nossa opinião.

A cena eletrônica, em especial a trance, mesmo após o crescimento que teve ainda é carente de material. Para vocês porque existem poucos veículos que procuram mostrar este nosso mundo?
Essa é uma pergunta que eu mesmo me faço há 10 anos! Hoje o Psicodelia é tocado por três pessoas, mas eu gostaria que fosse muito mais. No entanto, é incrivelmente difícil encontrar pessoas dispostas a colaborar com notícias sobre a cena, ou a ouvir e escrever um texto opinativo sobre uma festa ou um novo álbum. Inclusive se alguém aí estiver lendo isso e quiser escrever sobre o que acontece no dia-a-dia do psytrance, mande um email pra gente: contato@psicodelia.org

Você acredita que falta mais apoio por parte do público, núcleo e artistas para obtermos mais e melhores relutados?
Acredito, mas não dá pra esperar por isso. O que vejo é que cada pessoa envolvida com a cena tem uma visão muito particular do que considera “ideal”, e aí acabam apoiando somente aqueles projetos com os quais se identificam 100%. Isso é natural, acontece em qualquer lugar. O desafio de cada um que se aventura na cena produzindo algo (festa, musica, conteúdo, não importa) é justamente tentar quebrar essa barreira e conquistar seu público.

No início já tínhamos, mas com a popularização das festas e também o surgimento das redes sociais ficou mais fácil o compartilhamento. Qual a sua opinião sobre a divulgação e compartilhamento de vídeos e fotos de gente passando mal ou com surtos nas festas?
Isso é horrível. Quem nunca teve ressaca moral por ter feito exagerado em alguma noite e feito merda na frente dos amigos? Agora multiplique isso por milhões de pessoas vendo isso no Facebook? Esse tipo de exposição não é engraçado e pode gerar problemas muito maiores como perda de emprego, depressão profunda, etc.

O que é Psicodelia para vocês?
É um estado de espírito, que permite você enxergar as coisas de uma forma diferente e pensar fora da caixa.

Como você enxerga a cena trance daqui alguns anos?
Certamente muito maior e mais profissional do que hoje. Há alguns meses eu escrevi uma matéria para a HouseMag falando sobre esse momento de crescimento que vive o psytrance. Comentei que, diferente daquela bolha de 2007/08, hoje a cena parece crescer de forma muito mais sustentável, com muito mais festas de médio e grande porte espalhadas pelo país. Isso me leva a acreditar que estamos em um caminho de crescimento contínuo e consistente, e que no futuro próximo isso ainda vai gerar oportunidades que hoje nem conseguimos imaginar. Quem encarar a cena como um negócio a ser tratado com seriedade e profissionalismo ainda vai colher muitos frutos.

No próximo dia 16 teremos uma festa em comemoração a esses 10 anos, o que o público pode esperar desta comemoração?
Vai ser algo muito especial. Como o foco do Psicodelia sempre foi à produção de conteúdo, nunca havíamos nos aventurado no terreno das festas open air. Mas como o Aniversário de 10 anos era uma marca muito importante, começamos ainda no ano passado a realizar uma série de eventos menores, os “WarmUps” para aprendermos o que era necessário para realizar esse tipo de evento. Coisas como montar estrutura e organizar equipes de trabalho. Também testamos diferentes locais, várias configurações de lineup, etc., e agora chegamos na data do evento que era o grande objetivo desde 2016.

No lineup, teremos dois monstros da cena: Marambá, para os fãs de Dark e Rica Amaral, o cara que influenciou toda a cena trance brasileira nos últimos 20 anos. Além deles outros grandes nomes como o argentino Pragmatix e o projeto dele em conjunto com o Rica, o Men 2 Deep.

Da cena local, teremos o Titicow, um dos caras mais respeitados na cidade, além de algumas “revelações” em quem apostamos muito como Yakuza Project, Taurum, Brum!, Gorit e Mandhara.

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